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Momento certo para falar

Saúde mental Por Danielle Corrêa, Brazutopia

Números e gráficos desenham uma infeliz realidade. Uma realidade na qual fazemos questão de um dia não precisarmos mais falar. Por mais distante que isso esteja de nossas mãos, olhos, bocas e ouvidos se tornam instrumentos eficazes contra o suicídio.

Conversamos com a doutora em psicologia Lucia Cecilia da Silva há alguns dias e ela, prontamente, nos apresentou um panorama geral sobre o suicídio. Lucia, além de muito atenciosa, é especialista no assunto.

Quem

Jovens, negros, idosos, mulheres, crianças, homossexuais, homens, pessoas”

Não cabe apontar, descobrir quais são os fatores que levam uma pessoa a tirar a própria vida, até porque isso se trata de fenômeno multifatorial, multidimensional, de uma complexidade que envolve muitas coisas.

Mas, existe algo que transcende as estatísticas, sejam elas quais forem, é preciso, sim, lutar por melhor qualidade de vida, de todas as pessoas. “Em uma sociedade que valoriza o consumo, individualismo e preconceito, há sempre aqueles que são apontados. É isso que os machucam”.

Motivos

Não é um problema genético. Boa parte do problema está no contexto social”

Perdas de direitos, preconceito, precarização do trabalho, crise econômica e social. Depende muito de onde a pessoa está inserida. O que impacta você, não impacta o outro, e assim por diante. São ações que geram falta de perspectiva de futuro e insegurança da própria sobrevivência.

“Essas fragilidades e a falta de apoio social, familiar e político causam uma perda irreparável na sociedade. Sem apoio as pessoas têm dificuldades de encontrar soluções para seus problemas e entram em um sofrimento intenso”.

Além disso, a celeridade da vida, o rápido, o superficial, passaram a tomar conta da rotina.  Se tornando inimigos da saúde mental. “A rapidez é perniciosa. Precisamos de mais tempo para a elaboração emocional, daquilo que nos afeta, precisamos de mais tempo para digerir e encontrar perspectivas novas. O que vemos hoje são pessoas acumulando, acumulando e acabam não aguentando.

Comportamentos

Existem alguns parâmetros para nos guiar, mas cada caso é singular”

De forma geral todo mundo tem ideia de morte. Estar cansado, atribulado, pensar em dormir o dia todo e acordar ano que vem. Pensamentos inerentes ao ser humano. Mas, o que pode ser uma ideia bem distante para alguns, para outros a sobrecarga é mais pesada.

Com o tempo, de acordo com a especialista, isso pode evoluir e se tornar uma ideia suicida, quando realmente a pessoa pensa que seria melhor morrer. “Minha família viveria melhor sem mim, não faço falta para ninguém, sou inútil, não estou suportando mais” são frases verbalizadas por quem pode vir a estar pensando em cometer suicídio. Frases de alerta que são ditas, comumente, a pessoas mais próximas, familiares ou amigos.

Além disso, há o isolamento, a preferência pela solidão. “A pessoa fica mais abatida, tem distúrbio de sono, fica sem apetite, fica muito ligada, pensando o tempo todo. O comportamento dela muda, começa a falar para a família cuidar disso, ou aquilo, passa dados pessoais. Vai procurando dar assistência como se não estivesse mais aqui. É como se fizesse seu testamento”. Ou seja, a pessoa não está doente, mas ela começa a demonstrar preocupações que não cabem no dado momento.

O que falar

Temos preconceito das dores da alma, das dores emocionais. Isso faz com que muitas pessoas não procurem ajuda”

– Venho percebendo que você está isolado. Está acontecendo algo?

– Estou preocupado com você. 

– Você quer me dizer alguma coisa?  

Preocupação genuína resume bem o papel de quem quer ajudar. Se colocar a disposição, sem julgamento, sem discurso moralizante. “A dor do outro só ele que sabe. A pessoa sabe que não tem motivo para se sentir assim, ela não quer se sentir assim, mas diante algumas abordagens ela se julga e sofre ainda mais”.

A pessoa que quer tirar a própria vida vive uma ambiguidade, um conflito. Ela quer viver também. “Não é um ato de covardia, nem coragem. É desespero para sair de uma situação que está sendo insuportável. Alguns pacientes relatam que é uma dor que oprime, que pesa o peito”. Muitos não conseguem descrever, na verdade é um sentimento indescritível, por ser único e particular. O fato é que a pessoa não consegue enxergar nada além da dor que sente.

Para a profissional, é preciso estimular, acima de tudo, a procura por ajuda. “O trabalho do psicoterapeuta é se demorar nessa ambiguidade e trabalhar com ela. Pensar em conjunto em outras possibilidades, buscar um outro olhar diante a situação”.

Ela ainda completa: “Temos que lutar pelos direitos sociais, humanos, garantir o processo civilizatório. Educação, saúde e promoção da vida são itens obrigatórios”.

“Esse é o momento certo para falar. Um dos caminhos para prevenção”


Todo conteúdo descrito nesse texto foi aprovado pela psicóloga que concedeu a entrevista

Lucia Cecilia da Silva (CRP 08/2207)

Psicóloga pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), doutora em psicologia pela Universidade de São Paulo (USP) e pós-doutorada pela Universidade de Paris-Diderot (França). Suas pesquisas e publicações são nas áreas de Psicologia da Saúde, Tanatologia e Suicidologia. Docente no Programa de Pós-Graduação em Psicologia / Universidade Estadual de Maringá. Diretora do Veredas Instituto de Psicologia, Arte e Cultura, onde também atua na clínica psicológica.

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